o texto que eu estava planejando enviar hoje não era esse, mas percebi que não ia conseguir finalizá-lo. meu primeiro pensamento foi desistir, pular uma semana e voltar na próxima como se nada tivesse acontecido. mas eu tenho um compromisso comigo mesma: terça, 19h, publicar texto. mas sobre o que escrever, então? comi uma batatinha, sentei no sofá, arregacei as mangas e comecei a digitar.
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eu tenho pensado muito sobre compromisso. sobre se comprometer, especialmente com as pessoas que eu amo. eu sempre chego cedo nos lugares, cumpro prazos, falo que vou e apareço. só que eu tenho falhado com os compromissos que mais importam pra mim: aqueles que estabeleço comigo e com as pessoas que amo/me amam. escrever esse texto, por exemplo: não queria deixar de enviá-lo e sentir que posso me deixar na mão, especialmente quando tenho tanta facilidade de cumprir tantos outros compromissos com terceiros.
hoje percebo que sempre me tratei com menos cuidado, assim como não cuido tanto das relações de afeto e confiança já (aparentemente) estabelecidas. será que é por que eu sempre achei que o amor era suficiente? entrei forte nessa pira nas últimas semanas e concluí que não, o amor não é suficiente. isso me abalou muito.
meu pai morreu faz pouco mais de um ano e os nossos laços eram muito fortes. não éramos, tipo, melhores amigos e tinha muitos aspectos da minha vida que eu não compartilhei com ele. mas ele estava sempre lá pra mim: quando eu tava triste, frustrada, brava, querendo fazer mudanças de vida com as quais ele nem concordava; ele estava lá dizendo eu te amo e vai ficar tudo bem.
as demonstrações de amor iam pra além das palavras. meu pai fez parte da pequena parcela de homens que exercem ativamente a paternidade, mesmo passando a maior parte do dia trabalhando fora. ele demonstrava amor estando qualitativamente presente, mas não acreditava ser quantitativamente suficiente, então estava sempre reiterando: eu amo você e vai ficar tudo bem.
teve momentos em que senti raiva. eu achei que ele estava mentindo, pois às vezes as coisas não estavam nada bem e ficar falando que elas iam ficar não parecia resolver nada. esse sentimento apareceu antes e também depois de ele morrer. em terapia e conversando com amigas, eu decidi acreditar que ele não estava mentindo: eu te amo, por isso tudo vai ficar bem. não importa o que aconteça, importa é que estou aqui com você.
esses tempos, eu estava lendo bell hooks, tudo sobre o amor (editora elefante, 2021). é engraçado, pois ela fala sobre o falta do amor nas relações e como é importante que o cultivemos; que cuidado, respeito, carinho e compromisso são valiosos, mas não são amor.
só que, ultimamente, nas minhas relações, eu tenho sentido a problemática de validar apenas o amor. quem sabe ele seja o suficiente pra eu ter vontade de querer que as coisas se desenrolem bem, assim como meu pai acreditava, mas, pra além do amor, preciso cultivar todas as outas coisas: cuidado, respeito, carinho, compromisso, e talvez nem isso seja suficiente! talvez querer estar ali construindo uma relação seja algo em si mesmo e não uma consequência de amar. quem sabe seja isso. ainda estou tentando descobrir.
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hoje queria muito ouvir de você. trouxe reflexões inacabadas, por isso, se quiser compartilhar sua opinião, clica no botão abaixo. fico aguardando!
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além disso, compartilho algumas coisas que tenho consumido nessa última semana.
pra ouvir
→ crime e castigo, podcast da rádio novelo sobre justiça.
→ harry’s house, o terceiro álbum de estúdio do harry styles. track preferida até agora: satellite.
pra ler
→ mau comportamento, mary gaitskill (fósforo editora, 2021)
pra assistir
→ sétimo episódio da terceira temporada de atlanta: trini 2 de bone. episódio sem relação com a história principal da série, perfeito pra quem não acompanha.
pra beber
→ drink by me: gelo, 1 dose de vodka, o resto de olho: ginger ale, tônica + lasquinha de gengibre e 3 cerejas em calda.
abraços virtuais e desculpa incomodar!
luana
(desculpa incomodar com meu comentário)
o desejo de amar e de cuidar da relação nem sempre é mútuo... às vezes o outro não participa dessa troca e a gente internaliza como uma falha nossa.
é interessante pensar que as relações afetivas são ambivalentes, transitam entre amor e ódio.
tá tudo bem não conseguir amar plenamente hoje ou amanhã, assim como tá tudo bem odiar, pois é no amor que encontramos liberdade e conforto pra sermos o que somos de fato: vulneráveis. sentir raiva de quem a gente ama, querer distância, tomar um ar.
o que faz o amor funcionar é o equilíbrio que ambos precisam sustentar. um dia vc não tá bem, mas o outro tá e faz o possível pra dar afeto... e vice-versa.
tá tudo bem vc não conseguir se doar por inteiro pra todos, o tempo todo. redirecionar o amor pra vc mesma vai te recarregar a bateria social e emocional que a potência do amar precisa.
(adoro te ler!)
agradeço por vc não ter se deixado na mão hoje e ter publicado esse texto! nem sempre vamos conseguir fazer tudo aquilo que nos comprometemos, mas é sempre muito bom poder te ler.