8:26
termino a terceira xícara de café do dia. aguardo: o cuscuz cozinhar.
09:43
no escritório-ateliê, espaço da casa onde trabalho & faço cadernos, sentada na cadeira com rodinhas e apoio para os braços, vejo minha mesa de trabalho bagunçada: um lápis desapontado sobre um pedaço de papel rabiscado ao lado de uma fita durex; um incenso aceso, outro apagado; uma cerâmica armazenando gizes coloridos; o frasco âmbar com tintura de valeriana que me ajuda a dormir melhor; um quadro que pintei; uma foto minha na praia em 1999; uma xilogravura que fiz da minha vó.
antes de trabalhar, dei ração para minha gata, lavei a louça, passei café. olhei pela janela e suspirei: mar azul, céu azul. desde que me mudei, é difícil ficar deprimida em dias assim: a vista é bonita, as condições para lavar a roupa são perfeitas & não existe o risco de ficar sem energia nesta casa 100% abastecida pelo sol.
com a gata no colo, abro o e-mail: não há nada novo graçasadeus, apenas promoções & newsletters. acesso o notion: minha lista de coisas para fazer tem seis itens, dos quais três destrincham subtarefas e apenas um já está marcado como concluído. respiro fundo & abro o whatsapp.
11:54
movimentos em direção ao almoço.
13:06
praticamente todos os dias dos últimos dois anos eu checo as horas e está marcando 13:06. eu nasci em 13/06. me pergunto se isso quer dizer alguma coisa, se devo apostar em algum jogo, se não estou vendo algo que deveria ver.
14:15
sentada numa cadeira de praia à sombra, escuto: crianças gritando no ginásio da escola e pássaros nas árvores próximas; olho: os morros que dividem as partes leste e oeste do sul da ilha & o mar sem ondas da baía que divide a ilha do continente; bebo: café preto cujos grãos estavam inteiros há dez minutos, mas foram brevemente transformados em pó no moedor elétrico estragado-mas-ainda-operante que ganhei de L. e depois passados em água recém-fervida para virar o líquido escuro que me mantém viva; aguardo: S. que cochilou antes do nosso encontro de leitura semanal.
16:33
sempre que posso, gosto de tomar banho antes do anoitecer. hoje é um desses dias. de banho tomado, visto: uma camiseta branca limpa & uma bermuda estampada multicolorida; sinto: a recém-chegada brisa de outono percorrendo a pele descoberta. eu amo essa época do ano: hábitos de verão sem o caos da temporada & com a perspectiva de que, daqui pra frente, só vai esfriar.
acabei de colocar feijão branco de molho para fazer uma pastinha à la homus amanhã. assim que terminar esse registro, vou cozinhar gohan para preparar sushi simples à noite. minha gata, sinônimo de rotina, deita-se ao meu lado, os olhos fechados, a pata direita sobre a minha coxa; ela quer comer, mas ainda faltam duas horas.
19:12
sentada-deitada na cama com o notebook no colo, olho: a porta do quarto aberta com uma camisa cinza-escura pendurada há mais uma semana & as luzes pisca-pisca-que-não-piscam penduradas sobre a janela onde deveria haver uma cortina. espero: uma chamada de vídeo começar; sinto: a brisa do ventilador posicionado no último andar da pequena estante de três andares ao pé da minha cama.
20:54
a sensação de (outro) banho tomado percorre meu corpo, meu cabelo curto ainda está molhado mas vai secar por conta própria antes de eu me deitar. estou sentada no chão da sala sobre o tapete. tem duas velas acesas e uma taça de vinho do meu lado, o cheiro de batatas assando preenche o ar. estou sozinha em casa, circunstância que aprecio, mas com a qual não acostumei após o pôr do sol: uma vida inteira com medo do escuro faz com que minha guarda esteja sempre alta quando estou sozinha à noite, especialmente numa casa cheia de animais com vida noturna ativa. minha gata, inclusive, acabou de usar o vaso-de-planta-sem-planta que fica sob minha mesa de trabalho como caixinha de areia de novo. na outra casa, ela sempre fez suas necessidades na rua, mas acho que ainda não entendeu que a janela dos fundos da cozinha fica aberta só pra ela.
7:20
ultimamente nunca estou acordada nesse horário, mas tive uma boa noite de sono & forças maiores me obrigaram a levantar. caminhei até a cozinha, um pouco estressada confesso, & vi o sol nascendo atrás do morro.
devia sempre acordar mais cedo, pensei.
um podcast que está na minha rotina:
um poema de ana martins marques:
Pimenteira A pequena área de sol do apartamento cabe a ela: ela guarda o sol em seu coração rubro ruim e no prato que repartimos devolve-nos hoje ardente o sol de ontem