desço na rodoviária e decido fazer o trajeto até o hotel a pé para economizar. olho no mapa, são só 1,6 km de distância e eu gosto de caminhar. o check-in é a partir das 14h, ainda estou com tempo, mas quero chegar cedo. vou fazer cada hora paga valer a pena.
reservei um quarto de hotel na cidade onde não conheço ninguém bem o suficiente para perguntar se posso passar uma noite em sua casa. o quarto é da categoria budget, mas o preço ainda é meio salgado. mantive a reserva porque queria ver qual é, nunca fiquei em um hotel antes, só em casas de outras pessoas e airbnb.
no número 345 da rua 1131, as portas automáticas se abrem e eu entro no saguão. a estética do hotel envolve paredes de cimento queimado, luzes neon e estruturas de ferro no estilo industrial. já entrei em uma centena de lugares assim, de bares a consultórios odontológicos que querem parecer cool. fico triste porque uma porcentagem do que vou pagar pelo quarto envolve o “valor agregado” dessa estética que já me cansou.
sento em uma poltrona laranja para esperar o horário do check-in. tem uma família de três pessoas — pai, mãe, criança — e um casal aguardando também. o casal faz o check-in primeiro, Ela é loira, tem extensão de cílios, usa um boné rosa e um par de chinelos da adidas; a clássica turista de balneário camboriú, penso. com muitas malas, Ela e Ele seguem em direção aos quartos standard. a família vai ficar em um dos quartos baratos, como eu. eles fazem o check-in antes de mim e tiram algumas dúvidas que eram as mesmas que as minhas. talvez seja a primeira vez deles também.
sou atendida, assino uns papéis, pago, recebo dois cartões vermelhos. no elevador, aperto o botão 9 e não funciona. tento mais vezes, mas não vai. merda. volto pro saguão, mas os funcionários estão ocupados fazendo o check-in de outros hóspedes. merda. entro no elevador de novo e vejo um dispositivo preto com o símbolo de wifi e uma luz azul. olhando para os lados como se estivesse fazendo algo errado, posiciono um dos cartões que recebi em cima do aparelho como se estivesse pagando por aproximação. um bipe. aperto o número 9, ele fica azul. ok, estou em um ambiente tecnológico, penso.
na porta do quarto 957, o mesmo dispositivo do elevador. passo meu cartão, abro a porta, está tudo escuro. odeio quartos escuros durante o dia, não é natural. tento o interruptor, mas as luzes não acendem. estranho. meu primeiro pensamento é que eles ligam as luzes um tempo depois do check-in. atravesso o quarto tateando o espaço, alcanço a cortina e a arrasto para o lado, deixando a luz do sol finalmente entrar. tento abrir a janela, mas ela só se move 10 centímetros. abertura limitada, está escrito no vidro. deve ser pra ninguém se jogar dali.
vou pro banho, depois resolvo essa coisa da luz, penso. a água do chuveiro aquece, pois é a gás. graças a deus. a ducha é muito boa e, mesmo no escuro, o banheiro parece justo e limpo. tem toalhas brancas e sabonetinhos com uma embalagem biodegradável e a logo do hotel. volto pro quarto e deito sem roupa sobre uma das camas de solteiro. dali, alcanço um interruptor próximo à cabeceira. ainda sem luz. levanto, pego meu cartão e começo a aproximá-lo de tudo que tem no quarto — interruptores, lâmpadas, caixas de plástico na parede que eu não sei para que servem — talvez destrave algo e faça luz. nada. será que a categoria budget não inclui energia elétrica? parece impossível, mas não consigo parar de pensar que talvez seja isso mesmo.
vou para o meu compromisso, também a pé para economizar, e volto para o hotel depois das 18h. é fim de outubro, então ainda tem um pouco de sol nesse horário. ainda bem, pois a energia elétrica do meu quarto ainda não funciona. falo com uma funcionária no saguão, ela me dá um novo cartão e diz, preocupada, que o pessoal da manutenção já foi embora, mas, se não funcionar, me mudam de quarto. subo de novo, sem luz. volto ao térreo, a funcionária que trocou meu cartão está ocupada. um outro funcionário se aproxima e pergunta se preciso de algo. “meu quarto está sem energia elétrica”. ele pergunta se eu coloquei o cartão no dispositivo ao lado da porta. hum… não. ele me acompanha até o quarto. uma das caixas de plástico que eu não sabia para que serviam fica do lado do interruptor. o funcionário posiciona o cartão dentro dela e todas as luzes se acendem. era isso, então. agradeço e peço desculpas pelo inconveniente. ele apenas ri.
uma vez no quarto e com luz, desligo o ar condicionado que ligou sozinho. odeio ar condicionados. estou com fome, penso em comer na cama (não tem muitas opções, o quarto é minúsculo), mas os lençóis estão branquíssimos. sento no chão, com as costas encostadas na lateral do colchão. pego um pedaço de focaccia com coentro que trouxe de casa e a batatinha chips que comprei no mercado. abro o chardonney que comprei junto com a batata — ainda bem que lembrei de pegar um vinho sem rolha. ligo a tv, está passando um filme dublado. mudo de canal. largados e pelados, também dublado. desligo, não vou conseguir comer assistindo nada daquilo. passo o tempo falando sozinha.
ligo o chuveiro. prometi a mim mesma que iria tomar vários banhos nas 22 horas que passaria no hotel pra ter a sensação de que o dinheiro valeu. falo com meu irmão no telefone, finalizo um coisa do trabalho. só tinha comido focaccia e batatinha o dia inteiro, então abro o ifood. é difícil pedir comida nas segundas-feiras, mas encontro um restaurante chinês que tem um bom preço em yakissobas vegetarianos. escolho a opção de pagar no ato da entrega. meu quarto não tem telefone, então perto do horário descrito na tela do computador, desço até o hall. baixo o app no celular para acompanhar o pedido — a internet do hotel é boa, foi por isso que o escolhi — e me dizem que o entregador já chegou. olho em volta e fazemos contato visual. ele está puto, mas consegue fazer uma piada sobre o nosso desencontro. “tentei seu quarto, mas não tem telefone”, ele diz. “não, é o mais barato”, respondo. pago. peço desculpas novamente. no quarto, como o yakissoba assistindo um vídeo sobre as problemáticas da série pretty little liars. quando termino, lavo a embalagem na pia do banheiro.
durmo cedo, estou cansada. deixo a cortina aberta porque gosto de acordar com a luz do sol, mas acabo levantando da cama só 8h30. o café da manhã está incluso na minha diária, então lavo o rosto, dou uma organizada no quarto e desço para comer. o salão não está tão cheio e tem uma tv enorme onde passa um filme com o zac efron antes da harmonização facial. encontro a mesa onde é servido o café e procuro um lugar para sentar bem longe da televisão; criei o hábito de tomar uma xícara de café (preto, sem açúcar) antes de comer. o café da manhã é no estilo americano, você pode pegar tudo à vontade. dou uma olhada por cima, não tem muitas opções para uma boa refeição vegana. tudo bem. começo com pão, croissant e manteiga. depois pego mamão, banana, melão, aveia. suco de laranja. mais café. outro croissant para finalizar o potinho de manteiga. só mais um pouquinho de café. estou cheia.
volto para o quarto. o dia está ensolarado e, mesmo na categoria budget, eu tenho acesso à piscina que fica na cobertura. abro meu e-mail, não tem nada do trabalho. começo a escrever um texto até a comida baixar. às 10h, visto meu maiô vermelho, coloco uma toalha, meu cartão e o celular na ecobag. no elevador, aperto o botão 23. tem pessoas em volta da piscina, mas ninguém dentro dela. apesar do sol e do calor, tem bastante vento lá em cima. olho a paisagem: prédios altos e brancos, o mar atrás dele, um navio de carga no horizonte. tomo um ducha, entro na piscina. a água bate no meu peito. nado por cerca de 15 minutos, quero muito voltar para o meu texto.
às 11h, tomo meu último banho. a ducha é realmente muito boa. o piso do box é uma única grande pedra, o que traz a sensação de limpeza. arrumo a cama, recolho minhas coisas, aproveito a internet boa por mais alguns minutos. o check-out é até às 12h, mas minha ansiedade me leva ao saguão às 11h39. “número do quarto?”, “957”, “garagem?”, “não”, “luana?”, “sim”, “tudo certo, luana, boa volta”, “obrigada, tchau”, “tchau”.
as portas automáticas se abrem e eu sigo a rua 1131 na direção do mar. enquanto caminho, reflito sobre a experiência que acabei de viver: minha primeira vez em um hotel. valeu? valeu, mas acho que ainda prefiro ser hóspede na casa de outras pessoas.
luana